A dor do piscar e perder os "últimos"
- Agatha Pires
- 15 de nov. de 2022
- 3 min de leitura
Atualizado: 13 de jun. de 2024
Como a ansiedade em ver crescer e desenvolver nos volta aos primeiros novos momentos e nos faz pular etapas com nossos filhos.
Você certamente já viu vídeos fofos na internet ou até mesmo já passou pela deliciosa fase do boom de desenvolvimento dos bebês.. os primeiros passinhos, a primeira gargalhada, a primeira refeição..
Mas e você, mãe, consegue se lembrar do ultimo dia em que seu filho te pediu colo? Qual foi a ultima noite em que ele acordou pra mamar?
A verdade é que a maternidade é o eterno equilíbrio entre o "não aguento mais" e o "passa tão rápido"..

Assim que Heitor nasceu eu consigo me lembrar claramente da minha avó me dizendo: "Num dia você está lá, amamentando de 3 em 3 horas durante a noite, acordando cansada e sem forças, quando de repente num dia você acorda com o sol no rosto, se sentindo descansada e pensa: MEU DEUS, O QUE ACONTECEU COM O MEU BEBÊ?"
Ela conta que o primeiro dia em que minha mãe dormiu a noite toda sem acordar pra mamar ela foi ao berço pela manhã pensando que ela havia morrido.
O fato é que, talvez se no dia anterior àquele ela soubesse que seria o ultimo, talvez ela tivesse aproveitado muto mais, ficado acordada até um pouco mais tarde curtindo a ultima amamentação noturna, feito uma foto pra guardar de recordação e feito tudo isso com mais orgulho do que dor, com mais alegria do que cansaço.
Confesso que isso me pegou e senti que eu queria como mãe de primeira viagem ter a certeza absoluta de que viveria cada dia intensamente com meu filho, até que fosse o ultimo daquele estágio. Doce engano? Absolutamente.
Chegamos em casa da maternidade com um bebê saudável, tranquilo e que dormia e se alimentava bem. Até que chegou o quinto dia amamentando... os peitos racharam, a dor surgiu e cada mamada se tornava insuportável. As lágrimas escorriam e eu nem estou falando do bebê! Ele chorava de fome e eu chorava porque teria que matar a fome dele. Que dor horrível!
Digo com tranquilidade que foi um período insuportável. Todos os dias eu acordava e repetia pra mim mesma "é só por mais um dia, vai passar!" Pois sabia que qualquer dia daqueles poderia ser o ultimo sofrendo e de fato foi!
Em um belo dia eu estava no que seria um dos primeiros passeios sociais com o bebê eis que alguém me pergunta: "você está sofrendo muito com a amamentação?". Ora, eu estava prontíssima para responder que não sofria nada, estava tudo muito tranquilo pra amamentar... quando de repente passou um filme na minha cabeça!
"como assim está tudo tranquilo? eu não estou mais sentindo dor? quando isso aconteceu? Será que foi ontem? eu não consigo me lembrar se ontem ainda doeu ou se foi semana passada! Será que já faz mais de um mês?"
Eu não sei se é o turbilhão de novas experiências ou a rotina absolutamente insana, mas tem algo na maternidade que da um apagão na nossa memória, e eu confesso que talvez isso seja um mecanismo de defesa, porque para as coisas ruins É MARAVILHOSO poder esquecer os detalhes do que sofremos né?
O problema aqui é que entre um sofrimento e outro vem as delícias de ver um bebê em pleno desenvolvimento. Num dia ele dá o primeiro sorrisinho de canto de boca e você já imagina que lindo vai ser quando ele gargalhar! No dia seguinte ele consegue engatinhar e você já está na internet buscando dicas pra ajudá-lo a andar! A parte boa e gostosa da maternidade é tão boa e tão gostosa que parece nos despertar um senso de urgência em dar o próximo passo... e são exatamente os passos maiores que as pernas que vão nos custar a perda dos últimos momentos tão importantes no vínculo materno.
De repente meu pequeno faz dois anos e eu posso já não me lembrar mais quando foi o ultimo dia em que sofri amamentando, afinal minha memória foi junto com a placenta como dizem por aí, mas enquanto eu estiver por aqui tendo o privilegio de acompanhar o desenvolvimento dele, eu juro que farei todos os dias valerem a pena como se fosse o ultimo.. seja o ultimo tetê, o ultimo despertar noturno, a ultima fralda ou ultimo banho de banheira. Que tenha sorrisos, que tenha muita festa e comemorações... afinal a vida vale a pena.
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